13 de julho de 2013

CCDR da Casa do Povo de Quintos tem 38 anos de atividade no Inatel: Um exemplo de persistência...

Uma nogueira centenária, cujas raízes se refrescam no tímido fio de água da ribeira, dá as boas vindas a quem chega ao pequeno povoado caiado de branco que espreita o vizinho Guadiana. Quintos, uma aldeia com 265 habitantes.

Texto e foto Firmino Paixão

Outrora o moinho do Engrola era uma espécie de banca de peixe do rio que fazia a abundância de uma terra onde o comércio florescia e recebia romarias para provas do vinho novo. A camioneta da carreira, que pernoitava no largo da Casa do Povo, saia da aldeia pela frescura da manhã com muitos jovens que hoje são médicos, engenheiros e licenciados noutras áreas do saber. Os bancos que a sombra abundante da nogueira abençoa, são uma espécie de portagem que sinaliza quem entra e sai na ainda sede de freguesia, criada em 1940, mas também o ponto de partida para as tardes de futebol. O campo fica a caminho do sítio dos Pisões, perto da velha estação, ao abandono desde que amputaram o ramal de Moura, e dista cerca de 500 metros da renovada ponte que acede à rua das Bicas. Na berma da estrada, que na primavera fica perfumada pelos malmequeres, enfileiram­-‑se as bengalas firmemente seguras pelos espectadores fiéis, mas já com o passo mais curto e as pernas cada vez mais pesadas. Há 38 anos consecutivos que a equipa da Casa do Povo de Quintos iniciou a sua atividade desportiva. O retângulo de jogo foi desenhado na Herdade do Zambujal e cedido pela família Belard da Fonseca a troco de uma simbólica renda anual de um escudo. Mais tarde o latifúndio mudou de mãos e a junta de freguesia viu-se obrigada a adquirir aquele hectare de terreno para garantir a manutenção da atividade desportiva. Um dia o campo chamar-se­- ‑á António Felizardo, em homenagem ao grande impulsionador do futebol naquela terra. José António Periquito, outro filho da terra, é hoje o presidente do Centro de Cultura Desporto e Recreio da Casa do Povo de Quintos, também o treinador da equipa e testemunha: “Temos 38 anos de prática ininterrupta no Inatel, começámos a disputar o campeonato em 1975/76, havia poucas equipas, mas desde essa época nunca interrompemos a atividade. Éramos daquelas equipas de aldeia, sem campo de jogos, mas, sazonalmente, depois das ceifas, ajeitávamos o restolho e era ali que jogávamos”. 

Uma persistência invulgar e um espirito eminentemente amador, realçou “com o puro espírito de Inatel, e essa se calhar, é a razão de ainda existirmos. Nunca descurámos o que está inerente a estas equipas, depois de cada jogo vamos para o petisco, num convívio onde se recordam as peripécias do jogo, em que se marcam os jogos que ficaram por marcar, reforçamos a empatia entre as pessoas que tem feito sobreviver o clube durante todos estes anos”. 
Sempre por amor à camisola “seria impensável doutra forma, se bem que nesse momento se murmura que algumas equipas do Inatel já subvertem esse espírito e já se diz por aí que há dinheiro a correr, o que é grave, muito grave” lamenta José Piriquito, explicando este milagre de subsistência numa freguesia despovoada e envelhecida. “Tínhamos uma peculiaridade que durou até meados dos anos 90, só jogávamos com pessoas da terra ou que tivessem nela alguns laços familiares ou sentimentais. Somos uma família com ligações muito fortes”. Caberá aqui lembrar os fundadores do CCD e destacar António Felizardo: “Ele é a alma do clube, sem ele, se calhar, o Quintos não existia, ele sofre e trabalha todos os dias em prol do clube, agora com o apoio de antigos jogadores que vão amenizando o seu esforço, mas o António Felizardo é a razão de tudo isto existir”. Mas o desporto tem ali uma forte componente social refere o dirigente “as pessoas vêm ao campo porque nos identificam, vem o avô ver jogar o neto, vem o tio ver o sobrinho, vão os amigos” e nem os 500 metros que separam o campo da aldeia impedem a romaria “as pessoas superam isso, devagarinho, conversando e arrastando os cajados, passam ali um bocadinho da tarde”. Mais virada para a prática desportiva de lazer a equipa joga sempre pela melhor classificação, mas tem outros valores onde consegue sempre pontuar e o desporto federado não está no horizonte do Quintos. 

O presidente diz mesmo que “uma terra com pouco mais que 250 habitantes não pode entrar numa aventura em que só abrir a porta do campo já gasta, no mínimo, 250 euros. Não faremos como alguns clubes federados que entram em aventuras que não podem aguentar e depois vão curtir essas mágoas no Inatel”. 
Outra das preocupações é a união das freguesias (Quintos junta-se à Salvada) e o dirigente salienta que “temos uma grande proximidade com a nossa junta de freguesia, precisamos de qualquer coisa temos a junta ali à mão, no futuro não sei, porque na Salvada existem outras estruturas associativas, deviam ser levados em conta os serviços que prestamos à nossa comunidade”. Mas a fé continua inabalável e a dedicação ao clube insuperável “fazemos de tudo, somos dirigentes, enchemos as bolas, marcamos o campo, joguei futebol a outros níveis e houve uma altura que me fartei dele e então, se havia de dar a minha disponibilidade outro alguém, dou ao clube da minha terra e da minha paixão”.

1 comentário:

Manuel Araújo disse...

É este o verdadeiro espírito dos blogues. Dar a conhecer, por quem sabe profundamente do Associativismo sobre que escreve, as muitas histórias que o futebol promove.
E que inesgotável e diversificado acervo aqui se vislumbra, tão variados e profundos serão as perspectivas de quem o viveu.
Obrigado por esta página extraordinária, que nos mostra a riqueza deste país, que alguns exaltam, e só por isso merecem toda a gratidão.